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emRede - folha informativa

Padrões alimentares dos portugueses são insustentáveis, defende estudo

vegetables fruit marketA alimentação pesa 30% na pegada ecológica dos portugueses, mais do que os transportes ou o consumo de energia. Este valor faz de Portugal o país mediterrânico com a maior pegada alimentar per capita. A conclusão é de um estudo da Universidade de Aveiro (UA), que alerta para uma balança muito desequilibrada.

De acordo com os investigadores, a pegada ecológica nacional por habitante é superior à biocapacidade do país ou do próprio planeta, o que significa que se todas as pessoas no mundo consumissem como os portugueses, precisaríamos de 2,3 planetas Terra. Em termos práticos, 29% dessa pegada diz respeito à alimentação, 20% aos transportes e 10% à habitação.

“A pegada alimentar avalia em hectares globais (gha) a quantidade de recursos naturais que necessitamos para produzir o que comemos num ano. Sabendo que o país tem anualmente um ‘orçamento natural’ de 1,28 gha por habitante [valor de 2016], percebemos que só para nos alimentarmos ‘gastamos’ 1,08gha, ou seja, 84 por cento desse orçamento”, aponta Sara Moreno Pires, professora do Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território da UA.

Em comunicado, a coautora do estudo adianta ainda que se dependêssemos exclusivamente da biocapacidade de Portugal para nos alimentarmos “ficaríamos com um saldo de 0,20 gha para todas as restantes atividades de consumo [transporte, habitação, energia, vestuário, etc.], se não quiséssemos ter défice ecológico”.

O mesmo estudo dá conta de que grande parte da biocapacidade necessária para a nossa alimentação provém de outros países, como Espanha, França, Ucrânia ou mesmo China Senegal, o que implica uma pressão e uma dependência desses ecossistemas.

“Portugal é, por esses motivos, o pior país de 15 países do Mediterrâneo no que diz respeito à Pegada Alimentar”, alerta Sara Moreno Pires.

O estudo “Transição alimentar sustentável em Portugal: uma avaliação da pegada das escolhas alimentares e das lacunas nas políticas de alimentação nacionais e locais”, publicado na revista científica Science of the Total Environment, é assinado pelos investigadores Sara Moreno Pires, Armando Alves e Filipe Teles.

Peixe nosso de cada dia

Segundo avançam os investigadores, Portugal é o terceiro maior consumidor de pescado do mundo, com cerca de 61,7 quilos consumidos por pessoa em 2017 e 60% da biocapacidade para produzir esse pescado vem de outros países, sendo Espanha um dos parceiros comerciais mais evidente.

“A elevada intensidade da pegada ecológica de peixes como o atum, o espadarte e o bacalhau (não considerando a pegada associada ao seu transporte) são outra evidência que, aliados à sua força cultural na alimentação portuguesa, salientam ainda mais o impacto elevado do consumo de peixe na pegada alimentar”, lê-se em comunicado.

Além disso, o estudo identifica uma dependência da biocapacidade de países estrangeiros (como a Espanha, França, Brasil, ou mesmo a China) para produzir recursos alimentares, de modo a satisfazer a procura dos portugueses, sendo as categorias mais dependentes as de “pão e cereais” (em que se importa quase 90% dos hectares globais necessários à sua produção), “açúcar, mel, doces, chocolate, etc.” (com um importação na ordem dos 80%) ou “gorduras alimentares” (com cerca de 73%).

Políticas locais imprescindíveis

“Urge mudar hábitos alimentares e ter tolerância zero quanto ao desperdício”, sublinha Sara Moreno Pires, garantindo que “o papel das políticas públicas é igualmente crítico para promover sistemas alimentares mais sustentáveis, desde a produção agrícola, ao processamento, à distribuição, ao consumo ou ao reaproveitamento dos alimentos, e para envolver todos nesta mudança”.

O mesmo estudo identifica um conjunto de pontos fortes e fracos nas políticas de alimentação em seis cidades portuguesas:  Almada, Bragança, Castelo Branco, Guimarães, Lagoa e Vila Nova de Gaia.

Como importantes contributos dos municípios, o estudo destaca a sensibilização da população para a pegada ecológica da alimentação, através de ´calculadoras municipais da pegada ecológica´, disponíveis nos websites destas Câmaras Municipais, a promoção de hortas urbanas, hortas sociais e hortas pedagógicas, ou iniciativas como o Banco de Terra em Guimarães, através da sua Incubadora de Base Rural, ou a investigação agroalimentar, promovida pelo Município de Castelo Branco em parceria com o CATAA – Centro de Apoio Tecnológico Agroalimentar.

Das principais fragilidades identificadas pelos investigadores, a falta de recursos humanos adequados e com conhecimento especializado para trabalharem estas temáticas (com grupos multidisciplinares de profissionais qualificados, de nutricionistas a engenheiros florestais e agrícolas) ou de estruturas municipais para a promoção integrada de uma política de alimentação, são alguns dos fatores mais críticos.

O estudo mostra que é necessário investir em mais informação, mais recursos humanos, bem como na capacidade dos governos locais para promoverem sistemas alimentares equitativos, resilientes e sustentáveis.

“A coordenação entre atores e políticas, sobretudo a nível intermunicipal, ou mesmo nacional (nomeadamente com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional) é um passo necessário, bem como a sensibilização de todos os intervenientes na cadeia alimentar (da produção, ao processamento, distribuição, consumo e resíduos) para a mudança de comportamentos, de forma permitir um olhar renovado sobre como os sistemas alimentares se podem tornar mais sustentáveis em Portugal”, conclui.

Artigo originalmente publicado em Vida Rural.